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Todos os textos aqui publicados são escritos por mim, baseados em meus trabalhos acadêmicos da vida universitária construida na UNIFESP, no qual eu acho interessante e gostaria de compartilhar.

segunda-feira, 29 de março de 2010

A relação natureza e cultura



Há debates científicos que atravessam os séculos, tais como a questão da relação natureza e cultura. Muita tinta foi gasta em propostas de compreensão dessa relação, sobretudo no que tange à busca dos fatores que produzem o que é especificamente humano, centrando as explicações ora em características hereditárias e instintivas ora para as características do meio ambiente em que o sujeito se insere e no peso da cultura na condição humana.
A própria organização sócio-política ocidental moderna é influenciada por idéias sobre a natureza que a opõe às noções que representam os modos de vida considerados “civilizados”. A plena emancipação em relação à natureza, vale destacar, é um elemento importante do projeto moderno de indivíduo, cujas capacidades racionais são enunciadas como veículos para trilhar esse caminho que leva ao distanciamento do mundo natural, esse considerado “selvagem” e repleto de limitações.

 
A relação natureza e cultura na Antropologia

Em contraposição às teorias da utilidade e praticidade da cultura, a perspectiva estruturalista do antropólogo Claude Lévi-Strauss também representa a possibilidade de proporcionar um status maior à cultura, considerando-a em certa autonomia em relação à natureza. Em sua busca de elementos que pautam a distinção entre o que é cultural e biológico, Lévi-Strauss (1976) propõe que aquilo que se mostra constante na análise da diversidade cultural é critério para definir o natural. Por outro lado, aquilo que constitui uma regra reguladora dos comportamentos revela-se como fator cultural. A cultura é mais a expressão de uma economia de valores simbólicos do que um instrumento de garantia de melhores condições de sobrevivência da espécie.
Reserva-se à natureza, nessa perspectiva, o papel de mediadora para tais processos, de modo que a cultura busca na natureza as categorias sobre as quais se assenta para organizar o espectro social. Na argumentação da antropologia estruturalista francesa, mesmo as categorias do pensamento têm como inspiração a natureza. O pensamento é, portanto, estruturado a partir do modelo que a natureza lhe fornece, de tal modo que operamos mentalmente com base em categorias sustentadas em dados naturais.

O debate sobre a relação natureza e cultura é, a partir do que aqui foi exposto, complexo, sendo sua atualidade marcada pelos fatores históricos que demandaram à ciência encontrar as respostas sobre o que define as especificidades humanas, o que nos leva à questão da constituição do indivíduo ocidental no bojo da modernidade. Nesse sentido, cabe aqui destacar dois argumentos:

1) Desde o início da modernidade, o processo civilizador leva ao constante exercício de negação da dimensão instintiva da vida humana, através da emergência da necessidade de autocontrole como meio eficaz de regulação da vida social (Elias, 1990). À medida que a natureza foi impregnada dos sentidos que a tomam como campo de desordem, coube à razão, como atributo exclusivo humano, a tarefa de garantir a emancipação dos humanos em relação a suas características consideradas próximas aos animais.

2) O indivíduo, como argumentam Sennett (1988) e Velho (1994), é uma abstração que representa a busca de autonomia e de autenticidade, cada vez mais presente nos modos de vida ocidentais. Assim, ao descobrir o que lhe é específico, o indivíduo das sociedades ocidentais moderno-contemporâneas consegue ter em mãos a garantia de estar além dos limites naturais, projetando-se como um ser autêntico e singular.



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